Eu já pensei em sair do Facebook várias vezes. Mas esses dias aconteceu um fenômeno curioso, logo depois do lançamento do documentário O dilema das redes, disponível na Netflix. Como esse é um tema que me interessa, eu tinha colocado um lembrete para assistir assim que fosse lançado. E foi o que eu fiz: assisti na mesma noite. A princípio, o documentário não me despertou muita coisa. Acho que coloquei expectativa demais.
Eu esperava mais dados científicos, esperava ser surpreendida com novas pesquisas de comportamento, esperava alguma novidade e muito mais profundidade. Pensei: vou assistir mais uma vez para ver se mudo de ideia.
Só que nos dias seguintes começaram a pipocar nas minhas redes sociais as reações sobre o documentário. No meu Twitter e no meu Instagram, as opiniões eram mais ou menos assim: “Muito básico”; “Esperei tanto para ver o óbvio”; “Estamos em 2020 e as pessoas ainda precisam de um documentário que explique que estamos sendo controlados por algoritmos”.
Concordei.
Mas foi numa das minhas raras entradinhas no Facebook que notei justamente o fenômeno contrário – inúmeras pessoas indicando o documentário no nível “saia da rede e vá assistir isso A-GO-RA”. Olhando por detrás da telinha do meu celular pude imaginar essas pessoas como aquele emojizinho que tem a cabeça explodindo.
Resolvi então que não precisava assistir mais uma vez, a resposta estava dada. O documentário não era pra mim, não sou o público-alvo, porque esse tema para mim soa familiar.
E, muito embora eu não seja nenhuma especialista em algoritmos, eu sei o que eles são, do que vivem, e como se alimentam.
Mas o que para mim e para a “minha bolha” são temas aparentemente batidos, para muita gente é novidade. Entre eles, fake news, manipulação durante eleições, polarização e extremismo de opiniões, e o usuário como “produto” da indústria bilionária de anúncios. Tudo isso explicado por quem já esteve lá – ex-executivos de alguns dos maiores conglomerados tech do planeta, como Google, Pinterest e Facebook.
As críticas
Muita gente reclamou que eles não ouviram o outro lado (também senti falta disso), e inclusive o próprio Facebook soltou um comunicado rebatendo cada uma das críticas colocadas pelos entrevistados. Outro motivo de rejeição foi o fato de o documentário mostrar o problema, mas não apresentar soluções.
Gostando ou não do material, o fato é que eles praticamente “desenharam” para quem não entende nada de tecnologia, com direito a uma “novelinha” no maior estilo Malhação. Por meio de personagens fictícios, eles ilustraram como as redes sociais estão afetando nossa vida – especialmente a nossa saúde mental a nossa relação com as pessoas dentro e fora da esfera virtual.
O que é um algoritmo?
Para quem tem o hábito de se informar sobre comportamento e tecnologia, pode parecer chocante que muita gente não saiba o que é um algoritmo. E é por isso que um documentário “básico” (entre muitas aspas) como esse é tão importante, porque de certa forma abre os olhos.
No meu caso, por mais que eu tenha quase certeza que o Mark Zuckerberg na verdade é um robô que ainda vai causar uma destruição em massa no cérebro das pessoas se nada for feito nos próximos anos, decidi que vou manter a minha conta do Facebook. Porque essa é a única rede em que eu não fiz uma grande peneira de preferências.
Meu Twitter e meu Instagram são bolhas perfeitas onde só entram as pessoas com as quais eu concordo, admiro e respeito (e vice-e-versa). E também tem essa: começou a falar muita groselha eu vou lá e…pá: silencio. Ô, delícia.
Já o meu Facebook é quase como o bom e velho Orkutão, uma mistura de pessoas que estudaram comigo no ginásio e eu não lembro do nome mas lembro da cara; tias do ‘zap’ compartilhando receitas (sempre com muito leite condensado ou leite Ninho – invariavelmente, com as duas coisas juntas); primos de não sei quantos graus e fotos de bebês que são filhos de não sei quem; grupos de discussão dos mais diversos assuntos – de botânica a botox; gringos, brasileiros, indivíduos que entrevistei uma única vez na vida para alguma matéria; pessoas que passaram pela minha vida e eu sinto muita saudade; pessoas que passaram pela minha vida e eu não sinto saudade nenhuma.
No final das contas, essa rede demoníaca é a única que me faz lembrar que ficar seguindo só quem eu concordo, admiro e respeito só vai me limitar. É a única rede que joga na minha cara que nem todo mundo sabe o que é um algoritmo.
E é bom que todo mundo saiba! Então, fica aqui a minha dica: se ainda não assistiu, assiste sim. Depois você vê o que faz com isso; se vai pro Twitter criticar, se vai apagar todas as suas redes ou recomendar pra aquela sua tia do zap que adora compartilhar uma boa fake news.
Informação é poder: repasse.
REFERÊNCIAS
Hate Social Media? You’ll Love This Documentary
https://www.wired.com/story/social-dilemma-netflix-documentary/
Facebook Slams Netflix’s ‘The Social Dilemma’ as ‘Distorted’ and Sensationalist
https://variety.com/2020/digital/news/facebook-netflix-social-dilemma-documentary-1234791015/
What ‘The Social Dilemma’ Gets Wrong (resposta do FB ao documentário)
https://about.fb.com/wp-content/uploads/2020/10/What-The-Social-Dilemma-Gets-Wrong.pdf
3 perguntas e respostas que ‘O Dilema das Redes’ nos oferece sobre a era digital – texto escrito pelo meu querido professor Jorge Tarquini 🙂
https://trendings.com.br/ponto-de-vista/3-perguntas-e-respostas-que-o-dilema-das-redes-nos-oferece-sobre-a-era-digital/
O Dilema das Redes”: Facebook se defendeu, mas só levantou mais questões
https://www.uol.com.br/tilt/colunas/ricardo-cavallini/2020/10/07/7-coisas-que-e-preciso-responder-para-o-facebook-sobre-manipulacao.htm
Foto principal: The Social Dilemma | Facebook/Reprodução