Imagine comer sem contar calorias; sem sentir culpa ou, o que é melhor: sem se arrepender depois. Certamente, era assim que comiam as nossas avós, mas com a chegada das dietas restritivas e com a obsessão pelo corpo magro, paramos de ouvir os nossos sinais internos. Ao contrário: agora, seguimos listas e dicas externas para saber o que comer.
No entanto, há luz no fim do túnel. Essa é a proposta da alimentação intuitiva, uma abordagem que busca reconectar as pessoas aos seus sinais de fome e saciedade, para que comam de forma mais consciente.
Ao contrário das dietas restritivas, a alimentação intuitiva incentiva uma relação saudável com a comida e nosso próprio corpo.
Mas afinal, o que é alimentação intuitiva?
A alimentação intuitiva vai na contramão das dietas da moda e propõe uma relação mais tranquila com a comida. Em contraste às listas de alimentos e quantidades que as pessoas “podem” ou “não podem comer”, essa linha busca ajudar as pessoas a voltarem a prestar atenção nos seus verdadeiros gostos e, sobretudo, nos seus sinais de fome e saciedade.
Para entender melhor esse conceito, conversei com a nutricionista Ana Carolina Orsini, que é autora do livro “A cultura da dieta é tóxica”, e também é uma das entrevistadas do Além do Like!
Ana atua em uma linha mais humanizada, é especialista em nutrição comportamental e tem certificação internacional em Comer Intuitivo (Certified Intuitive Eating Counselor).
Como identificar sinais de saciedade e comer com consciência
DB: Como a alimentação intuitiva pode ajudar quem já passou por dietas restritivas e busca restabelecer a confiança nos sinais de fome e saciedade?
As dietas fazem as pessoas serem guiadas por regras externas (como horário para comer e quantidades pré-estipuladas), ao invés de confiar nos próprios sinais do corpo. Isso faz com que elas fiquem com o “fomômetro” quebrado.
Ou seja, a alimentação intuitiva ajuda o paciente a reconhecer e responder, sempre que possível, aos primeiros sinais de fome, assim como encontrar a saciedade confortável.
O objetivo é fazer com que ele volte a confiar em si mesmo com relação à comida e nas suas próprias sensações físicas, sabendo quando comer e quando parar. Em resumo, que volte a ter autonomia.
DB: A alimentação intuitiva pode ajudar a perder peso?
As estratégias da alimentação intuitiva fazem com que os exageros na alimentação sejam cada vez menos frequentes, além de incentivar uma relação saudável com os exercícios físicos. Isso faz com que ele atinja uma faixa de peso estável condizente com o seu histórico e biotipo, podendo, dependendo do caso, ser menor que o peso inicial do tratamento.
Mas é importante ressaltar que o comer intuitivo é uma abordagem não centrada no peso e está alinhada com a abordagem Health at Every Size (Saúde em Todos Os Tamanhos).
Escutando o corpo e reconstruindo hábitos
DB: O que é permitido comer na alimentação intuitiva?
Nenhum alimento é proibido no comer intuitivo. Incentivamos o paciente a buscar a “permissão incondicional em comer”. Isso significa: 1) deixar de classificar os alimentos entre “bons” e “ruins”, pois nenhuma comida isoladamente tem o poder de engordar ou deixar o paciente menos saudável. 2) escolher comer o que realmente quer e está com vontade. 3) comer sem se penalizar, ou seja, sem pensar em realizar comportamentos compensatórios.
DB: Muitas pessoas temem que esse “liberar geral” pode acarretar ainda mais exageros. Isso pode acontecer?
Pelo contrário; o objetivo da permissão incondicional em comer é justamente minimizar os exageros. Na verdade, essa ansiedade e sensação de descontrole são frutos da mentalidade das dietas.
Para exemplificar: pessoas que vivem de dieta acreditam que se “quebrarem” uma única regra, a alimentação de toda a semana está “arruinada”. Muitos caem no famoso “já que”: “ja que comi um chocolate e eu não podia, vou comer a caixa inteira.”
Superando o medo e confiando na intuição
DB: Como combater a ansiedade e o medo de perder o controle?
Fazer as pazes com a comida é um processo demorado e, às vezes, as pessoas não têm paciência de seguir no processo – que pode levar meses ou anos! Alguns não conseguem se desvencilhar da ideia de controlar ou perder peso, ou das suas crenças sobre comida.
Para não desistir, é importante entender que a alimentação intuitiva é um tratamento baseado em evidências científicas. Em contrapartida, já está comprovado que as dietas restritivas não funcionam a longo prazo.
Para que não se desespere, é preciso aceitar que ocorrerão exageros e até possíveis flutuações de peso até que a relação com a comida entre em equilíbrio.
No entanto, vale lembrar que esses exageros são passageiros e normais nesse processo, mas com persistência tudo tende a ficar estável e em equilíbrio.
Dica extra: como identificar a saciedade?
Pedi para a Ana oferecer algumas dicas para quem anda perdido com relação aos próprios sinais de saciedade. Prestando atenção ao próprio corpo, é possível construir uma relação mais saudável com a comida, sem culpa e com mais leveza. Anota aí!
Algumas dicas para se reconectar com os sinais de saciedade são:
- Comer consciente: faça pequenas pausas no meio da refeição para identificar as sensações.
- Identifique seus níveis de saciedade ao término de uma refeição. Pergunte-se: estou me sentindo confortavelmente cheio, ou ainda com um pouco de fome?
- Não se sinta obrigado a raspar o prato, nem tampouco a deixar comida. Nossa fome varia! Tem dia que você vai querer até repetir, e tem dia que não vai querer tudo porque sabe que vai ficar muito cheio. O importante é buscar perceber quando está confortavelmente saciado.
- Coma sem distrações – celular, TV, responder mensagem, trabalhar, etc. Comer com atenção pode te ajudar a identificar mais facilmente os níveis de saciedade.
- Evite “comer por obrigação”, porque isso também confunde os sinais internos. Muitas pessoas acabam pautando a própria fome por regras externas. Só pra exemplificar: o tal do comer de três em três horas”; se sentir obrigado a comer tudo quando estiver na casa de alguém; ou ter vergonha de recusar a oferta de algum alimento.
Se você ainda não conhecia a alimentação intuitiva, comece a escutar seu corpo e reconstrua sua relação com a comida.
Você é dono da sua fome! Aproprie-se dela!
Se não conseguir sozinho, busque ajuda
Para finalizar, uma recomendação: se você sente que não está conseguindo alcançar uma relação saudável com a comida, procure orientação de um nutricionista e de um psicólogo, se for o caso. Pessoas que já estão em quadro de transtorno alimentar, por exemplo, podem ter mais dificuldade de seguir essas dicas sozinho. Mas com ajuda profissional, isso é possível!
Você já conhece o Além do Like?
Se a ideia de escutar seu corpo e desenvolver uma relação mais leve com a alimentação te inspira, conheça meu livro, o Além do Like. Nele, exploro como a busca por aprovação e padrões de beleza afeta nossa relação com o corpo e com a comida.
É uma leitura que convida a refletir sobre a cultura da dieta e oferece uma nova perspectiva para quem deseja construir uma conexão mais saudável consigo mesmo.
Para mais informações, é só me mandar DM no Instagram. 🙂